quarta-feira, 1 de novembro de 2023

Dois livros de Antônio Almeida – notícias da militância sindical

 



 

Eu tive a subida honra, como diria Odorico Paraguaçu, de ser convidado para o lançamento do livro Experiências políticas no ABC Paulista, mormentemente porque eu já não estava na diretoria de nosso sindicato de professores da UFU e não sou historiador. Então, fui prestigiado pelo autor, que tanto admiro e a quem fui e sou grato.

O texto foi originalmente a tese de doutorado dele, defendida em 1996, USP. O título para a banca tinha sido Lutas, organização coletiva e cotidiano: cultura e política dos trabalhadores do ABC Paulista (1930-1980).



O lançamento, com debate, foi um dia de encontro de colegas de áreas teóricas diversas e também de diferentes setores do movimento popular e sindical em Uberlândia e região. A audiência era parelha com o teor do livro – mesmos sujeitos históricos das lutas e esperanças.

Hoje vejo que me preparei bem e demoradamente para o evento, pois rabisquei o livro todo e tomei notas nas últimas páginas em branco, algumas delas seguidas de pontos de exclamação. Temas como: trabalho e trabalhadores contra a ideologia do fim do trabalho; classe (Luta), mas não tanto luta de classes; direita / esquerda – contradições e conflitos; resistência!; Alegria – esperança; solidariedade! e... avanços obtidos.

O autor “ALMEIDA, Antônio de” – que antes e sempre foi para nós “o professor Antônio”, da História e da Adufu -   foi muito generoso ao autografar meu exemplar: “Amigo e companheiro de lutas Bento... Obrigado pelas jornadas e pelo entusiasmo na esperança de outra realidade mais justa. Antônio.”

 

El tiempo pasa... nos vamos poniendo viejos...” e de barbas brancas, de molho. Obrigado, Mercedes! E eis que, treze anos depois, compareci ao lançamento de um novo livro, cheio de memórias e reflexões do colega Antônio, igualmente aposentado e inventando nobres ocupações como essa de escrever e publicar. Esse evento foi na sede do sindicato, ADUFU, e estive na tranquila condição de ouvinte, na plateia, ao lado de minha filha Maíra.

Muito bom falar com o autor, já no momento relax dos comes e bebes. Legal rever os colegas do movimento sindical e popular. Pois Antônio sempre foi aquele camarada capaz de ajuntar grupos de bases diferentes e convergentes. E podem crer que ele colaborou muito nessa função de aproximar e aconselhar. Mesmo os outros colegas da nossa associação de docentes, os escaldados, os dinossauros, todos íamos até ele quando a barra pesava, quando o angu ameaçava encaroçar. Nosso Antônio era e é também um “conselheiro”. E não se trata apenas de conhecer o regimento e de saber propor táticas; é sobretudo a visão madura e ponderada, firme e compromissada com a grande causa popular-operária.

 

O livro contou com a contribuição de vários colegas, elas e eles, inclusive Raquel Radamés e Vera Puga, que assinam o texto da contracapa. Desta vez, o autor deixou como autógrafo a bela mensagem, extensiva a minha mulher, professora também: “Ao Bento e Wal. Obrigado pela convivência de tantos anos e pelos sonhos sonhados juntos. Antônio”.

 

Eu não pretendo fazer aqui nem ali uma resenha padrão deste novo livro de Antônio. Vou usar uma deixa de suas memórias, para promover um encontro para meia dúzia de colegas e umas duas dúzias de cervejas. Sucede que ele, bom historiador e tarimbado na esfera pública proletária, valoriza o boteco, em suas “memórias romanceadas do coletivo”. Ele criou personagens e inventou para si mesmo um nome e que assim vão se afastando e se reencontrando desde a infância nas lides campesinas até o trabalho acadêmico, passando por oficinas e escritórios. E muitas vezes, em qualquer quadra dessas seis décadas, as ideias se clareavam para a prática com boas doses de cachaça e copos de Brahma com colarinho.



Memórias entrelaçadas: o popular e o erudito nos espaços da universidade. Editora Subsolo, de Uberlândia, 2022. É um ótimo título para um itinerário que me fez lembrar o catatau de Sebastião Nery: A nuvem. O baixinho foi jornalista e assessor político e bicão onipresente, desde sempre. E gosta de repetir: eu estava lá, eu vi. Assim, eu também me vi envolvido pela leitura da crônica de Antônio, na onda do romance histórico, pois o tempo todo eu me via no enredo do colega professor, que saiu da roça e batalhou para estudar e melhorar o país e o mundo. E que acredito na permanência dos livros e na educação política através do debate e da mobilização.

Teremos que conversar num boteco – e faz tempo que não vou, desde que o Kabata fechou – pois este leitor aqui não conseguiria tomar distância para uma recensão acadêmica. A cada página eu ia anotando ou falando comigo mesmo: eu também estava lá, foi assim mesmo, eu me lembro bem... E as datas foram se alinhavando: 1961, 64, 78, 79, 82, 89... Nomes honrados (e também os nojentos) formando duas filas... dois arquivos.

Então, ao boteco. Lá, depois de umas tantas talagadas de Jurubeba Leão do Norte, eu poderei confessar ao autor Antônio onde foi que me emocionei – “com lágrimas nos olhos de cortar cebola...” – e quais parágrafos pulei por falta de estômago e de distanciamento no tempo histórico e biográfico. Foi golpe, foi genocídio. E cansa-nos o longo caminho da reconstrução.

É um livro importante, instigante e... pra manter a rima: intrigante. E não resisto ao bordão: “Esse livro não pode faltar na estante dos verdadeiros intelectuais empenhados e consequentes, etc.” E, de preferência, irão para a estante e para empréstimos a colegas de luta, devidamente amassado e cheio de anotações, sobretudo exclamativas. Uma caderneta de campo com nomes e apelidos. Um protocolo de pesquisa em aberto, entre o cotidiano e a teoria. Uma abordagem interdisciplinar e avessa ao relativismo pós-moderno.

 

Parabéns, colega Antônio de Almeida! De novo... e esperando mais.

 

(Uberlândia, dia de todos os santos, novembro de 2023 (inclusive Santo Antônio, São Bento, Santo Inácio, Santo Dias...)

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