quarta-feira, 25 de setembro de 2019

Nem Nancy, nem Axel

Não é a Nancy Reagan e nem o cantor do Guns and Roses. 



Esta dupla negativa, no título, avisa: não vou falar de Nancy Fraser e nem grande coisa de Axel Honneth. 

Outro dia, recusei educadamente um convite para banca de doutorado. A candidata, que eu não conhecia, não me levasse a mal e muito menos seu orientador, o qual conheço e era tipo meu sósia - o naipe.

Mas eu não iria a uma banca sem saber o básico sobre essa norte-americana Nancy. Eu teria que fazer alguma ginástica a fim de enquadrar essa militante e seu discurso ao ponto de poder criticar o seu provável afastamento da fonte, Habermas. 

Se eu ainda estivesse "na ativa", professor universitário em sala de aula, com os compromissos junto a nosso programa de pós, talvez me desse a esse trabalho. Verdade é que vou perdendo o pique e o interesse sobre certos desenvolvimentos. Mas também é certo que fiquei interessado na abordagem "normativa" da referida tese que, a essa altura, já deve ter sido defendida e aprovada. 

Essa tomada de posição pelo "normativo", pelo programa racional que visa também a substância das teorias sociais - e lhes reconhece uma direção, um interesse emancipatório - tem tudo a ver com a leitura que fiz de Habermas. E com o esforço que fiz para continuar a desenvolver alguns itens da agenda desse teórico crítico tão influente nos meios acadêmicos, há três décadas. 

Por motivos semelhantes, também tive que dizer "não conheço" a respeito de Axel Honneth. Esse alemão é vinte anos mais novo que Habermas e teria desenvolvido uma certa "Teoria do reconhecimento". Consultado por uma ex-aluna, hoje em programa de doutorado, tive que dizer como diria em tempos de atuação docente: desculpe, mas nunca li. 

E não foi por falta de material. Eu havia trazido da Alemanha um volume do livro roxo, da Suhrkamp: Kritik der Macht (Crítica do poder), mas tive que ler uma mala de livros para meu doutorado, em outra direção, inclusive obras de Marx, Neumann,  Koselleck et caterva. 

Mas neste segundo caso, pude ir um pouco além da recusa, até por não se tratar de banca. Nessa demanda, era possível enquadrar e auxilar, de longe, assim: a nobre e eventual consulente estava tão bem qualificada para um ataque indireto quanto eu mesmo, visto que estivemos juntos num aprofundado estudo da incisiva coletânea de Habermas: Discurso filosófico da modernidade. Ali encontra argumentos e posicionamento firme quem quer enfrentar e desbancar aqueles neo-conservadores sob o disfarce de "pós-modernos". Foi uma lavada geral, sobretudo contra os franceses. Mas também sobrou para o velho Nietzsche e outros vultos da "teoria tradicional", conforme o rótulo impiedoso de Horkheimer - avô da Escola de Frankfurt. 

Não sei até que ponto esse jovem (aliás, mais velho que eu sete anos) professor Honneth se apoiou em Foucault e, por conseguinte, até que ponto se aplicam a ele as críticas feitas ao francês pelo nosso teórico crítico predileto. E, além disso, eu não fiz o caminho de volta a Hegel - pois  para compreender as teorias da crise, o ponto de inflexão é a obra de Marx - e daí para a frente (não para antes do materialismo histórico, etc.)

A liberdade de pesquisa é uma bandeira aqui e acolá. As linhas de pesquisa e os interesses editoriais determinam também a nova produção, etc. Todavia, para resumir e sem querer ser grosseiro, volto a defender a linha que segui para minha própria pesquisa em filosofia. E não tenho motivos para me "atualizar" e nem para buscar novos autores que teriam "superado" Habermas. Como assim, meus caros hegelianos de...  

Preciso rir ao final, aqui, pois isso é um blog e não um pedido de bolsa ao DAAD. Sucede que outro dia li um artigo aparentemente agressivo de Domenico Losurdo que, de início irritava o leitor em geral, mas depois convencia o marxista em particular. Losurdo disse algo como "ninguém é obrigado a ser marxista, mas caso queira seguir tal autor, terá que adotar tais e tais categorias". Ou vá montar uma banda de rock, como sugeria outro conhecido italiano, Umberto Eco (acrescento por minha conta, sem risco). 

Well, no nosso caso e na nossa época, é pouco provável que alguém diga "sou habermasiano", mas é certo que muitos de minha geração não queiram banalizar o sentido certamente sério de "reconhecimento". Por suposto, não vale tudo para que se obtenha o sucesso efêmero no ambiente acadêmico e editorial. Vou me aferrar ao paradigma no qual investi. 

Isto foi apenas um post, sem destinatário fixo. 

E não está no blog que criei para falar de Habermas, pois não é sobre ele. Este post lá seria uma não notícia. 

Atenciosamente,

o Professor Titular deste blog do cerrado 

Hasta la vista, BIB