quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

De como um árabe levou os escritos de Aristóteles

Neste "Sertão da Farinha Podre" muitos mascates vinham com suas malas e bruacas. E também circulavam os retratistas, que volta e meia levavam um retratinho para ampliar. Pode ter sido um mascate chamado Xixi Piriá, que veio da Vila dos Confins ou fugia de algum arranca-rabo no Chapadão do Mário Palmério.
O fato é que as anotações de Seu Aristote sumiram. Talvez negociadas ou levadas por engano naquelas malas amarelas, de papelão, que a fumaça da Mogiana chamuscava. Os árabes - às vezes chamados simplesmente turcos - ficaram certamente com os escritos do moleiro, que ninguém classificava como tal. Era só o homem do moinho, que moía grãos e vivia disso, do que rendia, na troca.

Com o passar do tempo (cf. Wim Wenders: Im Lauf der Zeit), o porto, ou seja, a velha estação de jardineiras virou biblioteca. Mas nem ali, tão perto, pode ser encontrado qualquer manuscrito empoeirado de fubá.

As investigações ficam difíceis hoje porque muito tempo tempo é perdido, navegando-se. Aparece até uma dupla de Uberaba cantando "A mala amarela". Confiram no youtube: http://www.youtube.com/watch?v=RyupMLWFMkI

Qual é a conexão?

 Sucede que aquelas malas de papelão, muito comuns antes do plástico, eram chamadas simplesmente "malas de Uberaba", terra do Mário Palmério e, portanto, do mascate citado, árabe por suposto. A obra ficou perdida durante muito tempo em alguma mala, até que no de algum sarraceno...

Uma pista interessante veio por acaso, pra variar. Claro, um ouvido curioso notou aquela palavra ... Ao comer da broa e lembrar do colega Aristote, o Velho comenta que o moleiro era muito jeitoso e trabalhava em troca da maquia. Maquia? Antenas ligadas e respondem os neurônios: não tem registro, não tem registro... Maquia, confirma a patroa. Narrador pasmo. Como pôde conviver mais de meio século com eles e nunca ouvir tal palavra? Aprendeu a falar com eles, é verdade, mas jamais empregou "maquia". E explicaram que eram uma parte, o lucro do moleiro.

Hora de chamar o Aurélio, o Laudelino e o Houaiss (cuidado, pois não é "dicionário dos uais", hein...). E deu nisso: confirmado até pelos mythbusters! Confiram:

porção retirada por moleiros e lagareiros da farinha ou azeite que fabricam para outrem, como remuneração por seu trabalho

Então era isso, que devia encabular Aristóteles, mas garantia seu lucro: uma quarta de milho rende mais de uma quarta de fubá! E o que excede e fica para o dono do moinho é justamente a "maquia".

Mas, ainda uma vez: so what? E daí? O termo vem do àrabe e está na língua portuguesa pelo menos há cinco séculos. Tem cabimento, pois a família do Véiolavo está nas paradas ibéricas desde o século XV. E esse assunto vai longe, mas o texto não. Antes que o narrador seja chamado de o mala, talvez sem alça.



Um comentário:

Maíra Selva disse...

as malas de uberaba eram de papelão? puxa, mas eram tão resistentes... rs..