sábado, 15 de fevereiro de 2020

A cabana do pai Thoreau



Acabou que li um certo livro de auto-ajuda há uns oito anos. Se eu fosse procurá-lo numa livraria, talvez ouvisse o mesmo que ouvi numa locadora de videos, da boca de outra adolescente verdinha:
- A cabana do pai Tomás?
Não, não era essa obra, que líamos aos quinze anos por volta de  1970.
Assim como o "Meu tio" de Jacques Tati não matou um cara.
Tá te chateando, tchê? Siga, no más.

Agora, posto em sossego, resolvo ler grandes e pequenas obras que estiveram a minha espera para leituras e releituras: Walden é o título de um livro e antes era nome de lago. O leitor pode também gostar do subtítulo: "...ou a vida nos bosques".

Mas, por favor - sobretudo peço aos alunos do curso de direito - por favor, não matem o livro com a bandeira da desobediência civil. Esse tema, nesse livro, não toma cinco linhas do tempo de Thoreau - que tinha que plantar feijão, espantar marmotas, pescar e ler altas filosofias.

H. D. Thoreau - já formado em letras clássicas - construiu uma cabana de três metros por quatro e meio, num terreno cedido pelo amigo Ralph. Sim, o Emerson. Nome do meio: Waldo...

Os homens representativos são poucos. No livro de Ralph não enchem uma kombi: seis, inclusive Montaigne e Goethe. Mas essa aventura de Thoreau ainda cumpre seu destino excepcional: uma experiência moral e rural de longa duração em nossas mentes colonizadas e consumistas, etc.

Falei - sobretudo comigo mesmo - durantes quinze dias sobre Walden. E, sobretudo, pensei nessa bela obra na paz da roça (casa de campo é muita frescura) onde passo temporadas agora.

Não, isto aqui não é um resenha nem uma recomendação de leitura. Cada um que se vire pra ler H. T. Thoreau - que tampouco quis pegar na mãozinha e ensinar lições. etc. Nada paternalista esse outsider poeta de vanguarda.

Em vez de sair por aí a brigar com o fisco, o que fiz foi me encabular com a exportação de... gelo. Sim, Thoreau viu trabalhadores irlandeses ralando para retirar dos lagos vizinhos blocos de uma tonelada. Em trenós chegavam à ferrovia. E dali vendidos para outros países...

Como assim? Colheita e exportação de gelo, sobretudo para a Índia, sob domínio de ingleses esnobes. Confiram no google. Pista: "Tudor" foi o "Ice king", tinha o monopólio desse estranho negócio, que durou até a invenção da geladeira.

Pois bem. As frigidaires acabaram com o negócio de vender gelo. Mas continuaremos a enxugá-lo, ou seja, vamos ainda e sempre ler obras clássicas nesta era pós-moderna e sem caráter. Mesmo que o momento não apresente as minímas condições para enfrentar e vencer a indústria, o capital, o consumismo. Venceremos o tédio, quando muito, mas logo volta o bochorno.

Mesmo o author de Walden, só ficou no mato por dois anos e dois meses. Mas... e daí?
Eu ainda uso a literatura para fugir. Mantenha distância. 


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