Sete poemas de Nazim Hikmet
Fonte:
Yeni Siirler / Novos poemas (1951-1959),
volume 6. Istambul, Editora Adam Yayinlari, 1987, 184 páginas.
Nazim
Hikmet (1901-1963): poeta turco, que pertenceu ao Partido Comunista da Turquia,
viveu alguns anos na Rússia e passou por outros países da URSS – foi membro
importante da vanguarda europeia, contracenando com Maiakóvski e outros poetas
militantes.
Livro
de sebo. Estes poemas foram traduzidos por mero deleite com mel de tâmaras e
ainda no entusiasmo das descobertas, faz algum tempo. Contei com a colaboração
do compadre Google Tradutor, mas tive uma tarefa considerável para compreender
os poemas – ou torná-los legíveis em português – bem como manter a métrica e as
rimas, quando era o caso. Nem todas as referências de nomes e lugares foram
recuperadas, também devido às diferentes transcrições de chinês para o turco e,
daí, para nossa língua portuguesa do Brasil. É um esforço inicial de tradução;
não um estudo e nem uma tese sobre teoria da tradução. Eu já havia vencido a
resistência quanto ao uso de máquina, após traduzir com sucesso Hobbes desde o
latim, para cotejar com inglês.
1 –
Zhichun Ting
[Çi-Çun-Tin, página 15]
Zhichun
Ting, a mansão paradisíaca no lago Kunming.
A
cruel Cixi vem pálida olhar daqui a primavera.
Eu
também olhei. Sandálias passavam entre lírios:
E
cantavam “Amanhecer no Leste”.
Navio de Pedra
Há
um navio em Kunming, casco feito de pedra,
Velas
cheias de vento da China
Uma
que não se move
Uma
que cai na tristeza.
Sobre a escultura
Em
Wan Shenzen, mármore, olmo e marfim
Nas
mãos heroicas de mestres da seda
Eu
vi: esse texto é a síntese da delicadeza
Beldades
de Pequim em roupas azuis de trabalho.
1.10.52 e o bolchevique Ivan
Pessoas
brilhantes fluíam da Praça Tiananmen.
As
mais áridas terras são fertilizadas por esse rio.
Assisti
as festividades ao lado do Sun Yat-Sem.
Primeiro
mártir do Palácio de Inverno bolchevique Ivan.
(Pequim,
1952)
[NT:
Zhichun
Ting ou Pavilhão Zhichun é uma edificação na margem oriental do lago Kunming,
dentro do complexo Palácio de Verão. Cixi ou Si-Si foi a imperatriz que em 1888
desviou dinheiro para construir obras suntuosas como o Barco de Pedra – Shifang
– de 36 metros, em mármore, para repor um barco de madeira queimado 28 anos
antes.]
2 - Noite
[Aksam,
página 35]
Assim
como nas planícies da Anatólia,
O
ar é azul
Poeira
rosa
Luz
roxa,
É
noite na planície húngara.
As
árvores são familiares como as árvores de nossa planície,
Ao
pé das árvores no frescor do entardecer suado, quente
O
solo parece um capuz de soldado.
O
solo parece um capuz de soldado, dessa cor,
Tão
infinito, vasto
Assim
como nas planícies da Anatólia
É
noite na planície húngara.
As
estrelas estão pousando nos galhos
Entre
folhas
Junto
com os pássaros,
As
árvores são familiares àquelas de nossa planície.
As
semelhanças param aqui.
É
noite, é terra, é uma árvore.
Em
nossa planícies as crianças estão famintas
Noivas
de vinte anos de idade.
Em
nossas planícies, os bois têm um palmo de comprimento.
Nossas
planícies não planícies húngaras.
(30
de março 1954)
[NT: Aksam,
título original, tem uma cedilha no “S” e soa como “aksham”.]
3 - Mensagem
[Mesaj,
páginas 44-45]
Pacientes,
Meus
irmãos, vocês vão melhorar.
Dores
e males diminuirão.
Conforto,
aquecer
entre
galhos pesados e verdes
como
noite suave de verão.
Pacientes,
meus irmãos,
Um
pouco mais de calma, de teimosia.
É
a vida esperando
Atrás
da porta,
E
não a morte fria.
O
mundo atrás da porta,
O
mundo está lá cantando.
Você
se levantará de sua cama,
Irá
embora.
Você
descobrirá de novo o sabor
Do
sal, do pão, do sol lá fora.
Amarelar
como um limão, derreter, igual cera
Cair
de repente feito um plátano oco.
Meus
irmãos, pacientes,
Não
somos limões, nem velas, nem plátanos.
Somos
humanos, graças a Deus,
Graças a Deus, sabemos juntar esperança
A nossos remédios.
“Preciso viver!”
Diga
De pé insista
Pacientes,
Meus irmãos,
Vamos ficar bem.
Dores e males, diminuirão,
Conforto, aquecer
Entre galhos pesados e verdes
Como noite suave de verão.
(Frantisko, Lanzi – 30.6.1954)
[NT: Frantiskov Lazne, República Tcheca, na região
dos balneários Karlovy Vary, mas as datas em fontes biográficas dão o ano 1958,
quando o poeta Hikmet teria passado por aquelas águas medicinais. Por exemplo,
em <karlovarsky denik.cz>]
4- Não
deixem que nuvens matem gente
[Bulutlar adam öldürmesin, página 54]
De homens fazem elas os humanos que são.
Uma delas não te pariu entre dores?
Mães são uma luz adiante na escuridão.
Não machuquem as mulheres, oh senhores!
-Não deixem que nuvens matem gente.
Um menino de seis anos corre bem cedo,
Sua pipa está voando sobre o arvoredo.
Você já brincou assim livre sem medo.
Não maltratem as crianças, senhores!
-Não deixem que nuvens matem gente.
As noivas que penteiam seus cabelos
Procuram alguém no fundo do espelho.
Claro, muitas noivaram com esses velhos.
Não ofendam as moças, meus senhores!
-Não deixem que nuvens matem gente.
Na velhice, só as boas recordações
Devem nos fazer suspirar saudosos.
Que vergonha: não magoar os anciões.
Senhores, vocês também são idosos!
-Não deixem que nuvens matem gente.
(Fevereiro – 1955)
[NT: Duas bombas de extermínio foram lançadas
pelos norte-americanos sobre o Japão em agosto de 1945; os russos fizeram
testes em 1949 e 1955...]
5 - Independência
(Istiklal, páginas 85-86)
Eu conheço esses navios de guerra, exércitos
Eles também desembarcaram soldados
Em minha terra à noite.
Eles tinham sede do meu sangue.
Queriam roubar a luz dos meus olhos,
A habilidade de minhas mãos.
Nós derrubamos eles no mar.
Foi no não de 1922...
Meu irmão egípcio:
Nossas canções são irmãs,
Nossos nomes são irmãos,
Também se irmanam nossos cansaços.
O que há de belo, grandioso, vivo
Em minha cidade: pessoas, ruas, plátanos
Eles estão com você em sua guerra.
Em minhas aldeias, a “Palavra Antiga”*
É lida no idioma local, para Sua vitória.
Meu irmão egípcio, eu sei, eu sei,
Independência não é um ônibus;
Você perdeu um, precisa pegar outro.
A independência é como nossa amante:
Você traiu uma vez,
Vai ser difícil voltar de novo.
Meu irmão egípcio,
Seu sangue misturado
com as águas do canal.
A terra natal de uma pessoa
Torna-se a sua casa mais uma vez
À medida que seu sangue se mistura com seu sangue
Se mistura com seu solo e
Sua água.
Aquele que não sabe
Morrer pela pátria
Nem sequer está vivo.
1956, Kasim
[NT: Novembro
1956 – a crise do Canal de Suez começara em 29 de outubro, quando Israel, apoiado
por França e Reino Unido, declarou guerra ao Egito. Nasser, que havia
nacionalizado o canal, saiu vitorioso, uma semana depois. / *outro nome para o
Alcorão.]
6 - “Sofra”
(Sofra, página 113)
Fiquei louco naquela cidade,
Varna me jogou no divã, verdade.
Na mesa tomate, pimenta,
Linguado frito.
“Ó criados!” diz o rádio. Brisa do mar negro,
bonito.
Leite de leoa no copo de raki:
Acorde, anis!
Minha língua falada fraterna e feliz...
Um bem, melhor, bem feito...
Essa Varna me enlouqueceu
Louco de divã, eu...
(6 de junho 1957, Varna)
[* “Sofra”, em turco é “mesa”, mas preferimos
deixar o título no original, pela coincidência com tema clássico da poesia –
sofrer, nem que seja depois, saudades. Varna é cidade da Bulgária, banhada pelo
Mar Negro, “Karadeniz”.]
7 - Homem
otimista
(iyimser adam, página 178)
Quando criança não cortava as asas das moscas
Não amarrou no rabo dos gatos latinhas
Não prendeu baratas em caixas de fósforo
Não perturbou pobres formiguinhas
Ele cresceu
E fizeram tudo isso com ele
Eu estou a seu lado quando você morre
Um poema leia, disse
No sol no mar
Com caldeiras atômicas nas luas
Para a glória da humanidade
(Baku, 6 de abril, 1958)
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