“Outro que saiu da modorra foi o João-Grande. Modorra só,
que quase não dormia.
João-Grande era um jaburu solitário, cheio de manias,
filósofo. E sistemático: gostava só daquela lagoa, habitada de traíras e carás.
Não mudava de ponto, meio escondido na moita de capim-bengo, pés atolados no
barro preto. Passava dia e noite fingindo de morto, dormitando de ôlho sôrna,
mas pregado na rasoura da lagoa. E nada lerdo nas bicadas: desenrolava o
pescoço, que nem bote de cobra, e não errava peixe. Filósofo mesmo, que pouco
se lhe dava o espernear nem as dentadas das traíras já de dentro da capanga da
papada. Um cínico, o perna-longa – apesar do jeito sensaborão, sisudo e
intratável.”
(Mário Palméiro, Vila dos
Confins, J. Olympio, décima edição, p. 70)
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