domingo, 17 de outubro de 2010

UM KANTIANO NO CERRADO - homenagem a Valério Rohden


[Este post deveria aparecer em outro blog, o “filosofohabermas.blogspot.com”, mas ninguém consegue destravar o acesso daquilo. Assim, inauguramos um novo blog que poderá durar mais de um semestre. Creio que teremos assuntos e imagens.E já sei que as visitas são raras. De boa.]

O que o nome de Valério Rohden faz em um blog dedicado a Habermas?

Essa pergunta lembra-nos um episódio recente na academia. Valério parecia já brincar com sua própria imagem de “filósofo típico”. Desses distraídos que derrubam água e gravador durante conferências. Em 2008, ele falava em Uberlândia sobre sua recente paixão, a vida.  Goethe dava o tom, ao contrapor-lhe a fria teoria. O tempo ia ficando curto e Valério  começou a excluir folhas e mais folhas. De repente, falou baixo, meio em off: “Vou deixar fora isso aqui. E mais isso. Afinal, o que é que Hegel está fazendo na conferência de um kantiano?”

Neste mês de outubro, a ANPOF, que ele presidiu, certamente vai se lembrar de Valério, no encontro em Águas de Lindóia. A PUC do Paraná já havia organizado um congresso previsto para novembro deste ano, em que ele receberá homenagens. Póstumas, agora.

Para responder à pergunta inicial, recorto trecho da entrevista de Valério Rohden, em 29 de janeiro de 1999: “Há no meu livro Interesse da razão e liberdade” (1981) uma digressão sobre essa relação [o projeto inicial, com Dieter Henrich, incluía uma relação entre as éticas de Kant e de Sartre], mas cujo eixo depois se deslocou para um Kant mais frankfurtiano. Habermas era então uma estrela fulgurante, que favorecia uma ponte entre minhas reflexões kantianas e as inquietações políticas com o Brasil, mergulhado nos piores anos do Ato Institucional nº 5, e com meus colegas em Porto Alegre sendo todos cassados.”

Quando esteve em Uberlândia pela primeira vez, Valério foi conhecer uma reserva de CERRADO que a Universidade Federal mantém. Interessou-se por plantas e aspectos geológicos das margens do ribeirão Panga. Tomava notas em um bloquinho. Tempos depois consultava-me por email sobre nossa palmeira buriti. Na Venezuela ele ouvira que tal nome, variando para murichi, significaria “árvore da vida”. O naturalista alemão Humboldt teria registrado isso quando viajou pelo Rio Orinoco. Em 2008, Valério apresentou-se de novo em nossa universidade para falar justamente de “Teoria e vida”.

Dia 19 de setembro de 2010 é a data da morte de Valério Rohden. Não sei a causa e isso não interessa tanto, pois quando vejo que ele atualizou seu lattes dia 31 de agosto, cabe perguntar “o que posso esperar”, então? Que ele não tenha sofrido já seria uma boa notícia. No mais, é bom nos lembrarmos dele além da ficha básica de tradutor de Kant. A política motivou sua pesquisa. E a vida foi o tema e o interesse maior que coroou seu trabalho e seus dias.

(A entrevista está na revista Educação e Filosofia, vol. 13, n. 25, p. 9-26, jan./jun. 1999 – entrevistador: Prof. Marcos César Seneda. <www.seer.ufu.br> Texto traduzido e publicado também na revista alemã Tranvia, caderno 61, jun. 2001, sob o título “Kant als Schicksal”


5 comentários:

Bento Itamar Borges disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Bento Itamar Borges disse...
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Bento Itamar Borges disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown disse...

A eterna aluna graduanda (nunca graduada), mas que, acima de tudo, acredita no projeto blogueiro filosófico do professor Bento deixa seu comentário de teste e incentivador!!! Que o blog persista e que as ideias de Rohden também, pois como ouvi hoje (não me lembro de quem) "só os grandes criadores morrem, suas ideias não"
Panmela

Rafael Cordeiro disse...

Agradável lembrança, caro Bento!!! Não apenas do grande Valério Rohden, mas de sua presença entre nós, aqui no cerrado!